Capote, real. Bennett Miller. Canadá/EUA, 2005. 35mm, cor, 114 min.
Há mais para admirar aqui do que a composição de Philip Seymour Hoffman. Centrando-se na investigação que deu origem a In Cold Blood, livro adaptado ao cinema numa magnífica obra realizada por Richard Brooks, o filme afasta-se do relato biográfico que tudo quer abarcar para se concentrar num momento decisivo da obra e vida do escritor Truman Capote. Decisivo, porque o coloca perante a sua vaidade. Os maneirismos de Seymour Hoffman não são excessivos nem tentam reproduzir com exactidão o excesso de Capote, confundem-se antes com uma pose que o escritor se esforçava por manter para os outros. Da voz à postura, dos gestos às frases, ele desenvolveu uma imagem que usava nas mais diversas ocasiões para obter o que queria (reconhecimento, informação, acesso, exposição). O actor dá a ver e a ouvir com transparência esse esforço que também é o seu, acompanhado por um elenco espantoso. É isso que dá ressonância dramática e simbólica à solidão da personagem e à comoção que lhe desfaz a pose. A estreia de Bennet Miller na realização é auspiciosa no modo como utiliza esta performance. O filme tem também uma cadência concisa, um sentido do detalhe, que traduzem a escrita de Capote para o cinema sem recorrer directamente às suas palavras. [23.02.2010, orig. 02.2006]