Mr. Deeds, real. Steven Brill. EUA, 2002. 35mm, cor, 96 min.
Há poucas semelhanças entre esta nova versão e o clássico de Frank Capra. Nada contra: é infrutífero fazer novas versões sem assumir a novidade que elas podem trazer. Mr. Deeds não é um repetição, mas pode ser considerado uma actualização, das personagens, da história, e do humor. Muitos verão este filme, sem terem visto Peço a Palavra (Mr. Smith Goes to Washington, 1939) e até sem o desejo de o verem. Esses espectadores não guardam o original na memória. Por isso, esta obra realizada por Steven Brill está feita como se ele não existisse. O que faz com que qualquer comparação seja pouco fecunda. Também neste caso há um homem provinciano que recebe uma avultada herança de um tio que morreu e é vítima da sua imensa crença na bondade humana. Será usado por jornalistas sem escrúpulos e manipulado por executivos gananciosos. Estas são as semelhanças. As diferenças notam-se desde logo na personagem principal. Adam Sandler já representou este papel noutros filmes e essa frequência tem-lhe dado uma estranha autonomia: é um homem cuja infantilidade e bondade o protegem dos perigos da idade adulta, potencialmente um tempo de mentiras e hipocrisias. A ingenuidade desta criança num corpo de homem colide com o calculismo que dirige o filme, através de gags e personagens que dispersam a narrativa, de forma desajustada e disparatada. Nessa contradição são esbanjadas as possibilidades humorísticas do projecto, destacando-se apenas John Turturro interpretando um leal criado de ascendência hispânica. A componente romântica também é afectada: o seu carácter puro e transparente vai sendo apagado pela indiferença e condescendência. [10.03.2010, orig. 06.2003]