Medo de Morte, real. Wayne Kramer. Alemanha/EUA, 2006. 35mm, cor, 122 min.
Oleg (Cameron Bright) e Joey Gazelle (Paul Walker) correm para um carro. Estão assustados, cansados, ensanguentados. A imagem é densa, granulada. A violência é inscrita nela com grande gravidade. O que aconteceu até essa cena é uma tensa corrida. Tommy Parello (John Noble) costuma pedir a Joey para se desfazer das armas utilizadas em homicídios, mas ele guarda-as na cave, sem a sua mulher Teresa (Vera Farmiga) saber. O filho (Alex Neuberger) de 10 anos e Oleg, o seu melhor amigo e vizinho, vêem-no a guardar uma pistola, usada para assassinar um polícia. Oleg rouba a arma, dispara contra o seu irado padrasto, e foge. Durante essa noite, Joey tem de reaver a arma incriminatória antes da polícia ou dos criminosos. A descrição é importante, porque os violentíssimos acontecimentos deste filme são desencadeados pelo acesso de uma criança a uma arma de fogo. A morte que ela pode provocar é mostrada antes. Em Medo de Morte, a violência não é um espectáculo, mas um acontecimento com consequências concretas. A sua enérgica estilização não a torna insignificante: dá-lhe expressão e intensidade. Wayne Kramer, o realizador de Má Sorte (The Cooler, 2002), dedica o filme a estes cineastas estado-unidenses: Brian De Palma, Sam Peckinpah, e Walter Hill. A exuberância visual com que cada agressão e morte são representadas no cinema deste trio é indissociável de uma dimensão profundamente humana. É isso que Kramer recupera com efeitos de montagem e invulgares ângulos de câmara, que quebram a unidade do espaço e a linearidade do tempo para ligar eventos e personagens na mesma fluidez. O aspecto fragmentado e casual da narrativa é portanto uma aparência. Há uma sofisticada matriz sob ela. Desde o início que esta noite tenebrosa é povoada por figuras monstruosas que Oleg enfrenta — e que o genérico final apresenta como personagens de um conto dos irmãos Grimm. São seres mascarados que chocam com a crescente autenticidade da família Gazelle e com o peso moral das suas acções — os actores entregaram-se bem a esta exigente e coerente diferença de registos. Joey também se escondia atrás da dissimulação e terá de enterrar essa mentira para que uma nova unidade familiar surja. [19.04.2010, orig. 05.2006]