Film socialisme (2010)


Film socialisme (Filme Socialismo), real. Jean-Luc Godard. França/Suíça, 2010. DCP, cor, 101 min.

Depois de O Acossado (À bout de souffle, 1960), Le gai savoir (1968), Número Dois (Numéro deux, 1975), Salve-se Quem Puder (Sauve qui peut (la vie), 1980), e Nova Vaga (Nouvelle vague, 1990), Jean-Luc Godard começa de novo e reinventa o cinema. O título Film socialisme sugere uma transfiguração do segundo termo pelo primeiro, não o contrário — um filme como algo comunitário (político, no sentido aristotélico), irmão do socialismo (menos como ideologia e mais como “genealogia espiritual e ética”, como escreveu Eduardo Lourenço). A obra tem três andamentos: num cruzeiro pelo Mediterrâneo, no íntimo da família Martin, e de seguida entrelaçando o social e o familiar, a grande e a pequena comunidade, numa revisitação da história europeia, da Grécia Antiga à Catalunha. A montagem visual e sonora explora tensões em vez de as apagar ou resolver, entre a contemplação e o consumo, a produção e a distribuição, a lei e a justiça — questões vitais, portanto. Godard não acredita na narrativa? Acredita talvez demais. Acredita tanto, que cada pessoa e cada objecto anunciam sempre outras narrativas. Acompanhando o filme, a nossa história aparece absurda, a aproximar-se do zero. Mas é preciso acompanhá-lo mais além, na sua visão apocalíptica, capaz de levantar o véu sobre as coisas. Como o “Consummatum Est” que conclui Nouvelle vague, o “No Comment” que encerra este filme pode parecer lapidar, mas não pretende ser definitivo. Tomemos estas palavras como um convite a que se fale depois e por causa delas. [12.04.2011, orig. 03.2011]