Hangmen Also Die! (1943)


Os Carrascos Também Morrem, real. Fritz Lang. EUA, 1943. 35mm, pb, 134 min.

Os Carrascos Também Morrem (Hangmen Also Die!, 1943) é um filme anti-fascista feito nos Estados Unidos, dois anos depois de o país ter entrado na Segunda Guerra Mundial. Pertence ao conjunto de obras que tentavam convencer o povo americano sobre a justeza desta participação. Olhemos apenas para o cinema popular americano, excluindo os filmes de propaganda como a série Why We Fight (1942-45), dirigida por Frank Capra e Anatole Litvak. Alguns filmes apresentavam a aliada União Soviética com simpatia aquando da invasão nazi, como Song of Russia (1944). Outros filmes narravam dramas no teatro de guerra, focados nas forças armadas americanas, como Guadalcanal Diary (1943) ou centrados noutros contextos, como Edge of Darkness (1943) sobre as forças de resistência norueguesas. No meio de todas estas obras, Os Carrascos Também Morrem é um caso singular. Foi realizado por um grande cineasta exilado, que tinha sido um dos nomes fundamentais do expressionismo alemão: o austríaco Fritz Lang. A sátira cómica tinha sido uma das vias no retrato dos nazis, através de filmes de realizadores emigrados como O Grande Ditador (The Great Dictator, 1940) do britânico Charles Chaplin e Ser ou Não Ser (To Be or Not to Be, 1942) do alemão Ernst Lubitsch. Neste filme, esse retrato é mais dramático e para isso concorre a música de Hanns Eisler, futuro compositor do hino da RDA, como elemento basilar. A crueldade nazi é evidente desde a primeira cena em que se discute a execução sumária de centenas de trabalhadores para esmagar os movimentos de boicote da produção nas fábricas, nomeadamente de material de guerra. Lang estrutura a tensão a partir dos espaços, das perspectivas, e das relações entre indivíduo e grupo, preferindo caracterizar subtilmente as personagens através de pequenos gestos. A narrativa foi inspirada no assassinato de Reinhard Heydrich, em 1942, o Protector da Boémia e Morávia, a região checa ocupada pelos nazis. Era o número dois da SS e foi um dos principais mentores do Holocausto. Era conhecido como o “carrasco de Praga”, daí o título do filme. A estória foi escrita por Lang e Bertolt Brecht. O guião ficou a cargo de John Wexley, membro do Partido Comunista dos EUA, argumentista mais tarde colocado na lista negra de Hollywood quando a perseguição aos militantes e simpatizantes comunistas se intensificou. Lang e Brecht reuniam regularmente para discutir ideias, com a participação de Wexley, que foi produzindo rascunhos do argumento a partir dessas sessões. A produção do filme teve alguns problemas, mas, ao contrário do que por vezes se diz, Brecht não o renegou. No essencial, ele ficou descontente com o facto de não ter sido creditado como argumentista e com a eliminação de várias cenas dos prisioneiros no campo de concentração, entre o editor, o operário ferroviário, o padre, o poeta, e o professor, criadas quase exclusivamente pelo dramaturgo alemão. Os diários de trabalho de Brecht publicados em 1973, assim como os comentários posteriores de Lang, mostram que o problema esteve sobretudo na aceleração da produção a partir de determinada altura e na necessidade de diminuir a duração do filme, que ainda assim tem 134 minutos. Não houve propriamente discordâncias políticas, mas algumas divergências estéticas. Os Carrascos Também Morrem acabou por ser o único filme americano com o nome de Brecht nos créditos, embora haja indícios de que tenha trabalhado noutros projectos realizados. Ele deixou os Estados Unidos pouco depois de testemunhar perante o Comité de Actividades Anti-Americanas. O poema escrito pelo operário aprisionado, “A Tocha Invisível”, tem claramente o cunho de Brecht. Começa com estes versos: “Caros patriotas, chegou a hora / Caros patriotas, há trabalho a ser feito / Levantem a tocha invisível e passem-na adiante / Mantenham-na acesa, mantenham-na acesa / avançando na estrada que não tem curva.” Fecha com um verso afirmativo: “Sem rendição!” (em inglês, “No surrender!”). Brecht queria que este fosse o título do filme, mas, segundo Lang, tal não aconteceu porque durante a rodagem foi lançado um livro com o mesmo título. Seja como for, o realizador encontrou outra forma de expressar a ideia de que, ainda que os nazis não tivessem sido derrotados, a resistência anti-fascista não desistiria desse objectivo. Antes do “The End” foi incluído um “Not” — “Not the End”, portanto, “Não é o Fim”. [08.11.2023]